Revista Pernambuco faz edição comemorativa dos 90 anos da morte de Pessoa

Edição de dezembro é monotemática, com matérias exclusivas sobre o escritor. Quem assinar a revista até 31 de janeiro receberá a graphic novel Tabacaria, desenhada pelo quadrinista Greg

O quadrinista Greg faz uma leitura sensível do texto e da época em que o poema foi escrito por Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa
O quadrinista Greg faz uma leitura sensível do texto e da época em que o poema foi escrito por Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa

“Nunca pensei que isto que chamam morte tivesse alguma espécie de sentido.”  A frase de Fernando Pessoa é visionária. Noventa anos após sua morte, de fato, ele nunca esteve tão vivo.  Diferente de quando circulava pelas ruas de Lisboa, e tinha publicado apenas um livro (Mensagem), a obra do poeta disseminou-se pelo mundo nas últimas nove décadas, alcançando milhões de leitores, atraindo centenas de pesquisadores e provando que, de fato, sua escrita é atemporal, imortal. 

A Revista Pernambuco, que comemora seus dois anos de lançamento, aproveitou a data para celebrar não a morte, mas a vida e a contemporaneidade na obra do poeta. Na edição especial de dezembro, traz um exemplar  monotemático sobre Pessoa, mostrando várias facetas desconhecidas, e outras nem tanto, suas: os últimos momentos de vida; o lado brincalhão e bem-humorado, lembrado pela sobrinha; os pesquisadores que continuam desvendando seus escritos ; seu mapa astral do nascimento; as comidas citadas na sua poesia, que refletem suas paixões culinárias; e a “biografia” de uma tradução do Livro do Desassossego para o hebraico, entre outras reportagens e artigos.

A Pernambuco também preparou uma graphic novel - ou banda-desenhada, como chamam os portugueses -  com o poema “Tabacaria”, que seguirá de brinde para os que assinarem a revista até 31 de janeiro. Elaborada pelo desenhista e quadrinista Greg, a obra reinterpreta o mais famoso poema do lisboeta, dando-lhe uma coloração especial: o artista não apenas insere as questões existenciais colocadas por Pessoa, mas aproveita o panorama de Lisboa para relembrar fatos históricos que marcaram a cidade e os seus habitantes. 

Desenhado à mão e colorido digitalmente, o trabalho de Greg é marcado por cores esmaecidas, imagens nostálgicas e melancólicas, prédios devastados, e flashbacks,  para compor o poema de Pessoa.

Nos desenhos, aparecem soldados da Primeira Guerra Mundial - um lembrete da fragilidade  de Portugal,  que não tinha estrutura para se incorporar aos aliados, pois possuía armamentos obsoletos e um exército frágil. Episódio que  deixou marcas nas milhares de famílias que perderam seus filhos. 

Os anos que se seguiram ao conflito foram agitados: crise econômica, conspirações e embates. Os artistas da época, certamente, captaram o mal-estar de uma República que sonhava grande. Na graphic novel, Greg registra, ainda, os prédios históricos lisboenses crivados por balas, lembrando que no período em que “Tabacaria” foi escrito - janeiro de 1928 - o país enfrentava embates civis. 

Greg mostra os prédios históricos lisboenses crivados por balas, lembrando que no período em que “Tabacaria” foi escrito, janeiro de 1928, o país vinha enfrentando diversos embates civis contra os militares, que tomaram o poder em 1926. Os embates culminaram  em uma guerra civil conhecida como a Revolta de Fevereiro. 


Textos

A edição monotemática da Pernambuco de dezembro é uma obra colecionável, para os que amam a obra de Pessoa e para os que querem conferir visões diversas sobre o escritor. Fugindo do lugar-comum, a revista traz temas que escapam ao usual. 

O jornalista Álvaro Filho, por exemplo, registra os momentos finais do poeta, que passou mal e foi levado para o hospital sem a presença da família, que morava longe de Lisboa. O repórter também mostra uma visão pouco usual do temperamento de Pessoa: o bom-humor.

 Quem descreve episódios de um homem brincalhão é a sobrinha do poeta, Manoela Nogueira, que à época tinha 10 anos, e que hoje, aos 100, ainda lembra dos encontros com o tio. 

Outra abordagem curiosa é sobre os poemas que trazem o nome de iguarias portuguesas e os vícios cultivados por Fernando Pessoa. Em vários livros e com vários heterônimos, o escritor registrou na sua obra a dobrada portuguesa, o pão quente, os vinhos, os cigarros, os cafés e até mesmo o ópio, comum na época.

Entre as abordagens inusitadas, uma chamará a atenção : versado em ciências ocultas, Pessoa admirava a astrologia. Em sua homenagem, a revista traz o mapa astral do poeta, analisado por um dos maiores astrólogos brasileiros, Eduardo Maia.

 Durante a avaliação dos trânsitos astrais do lisboeta, Maia descobriu importantes revelações, como um aspecto benéfico conhecido como azul do céu, e um problemático, que trata de uma ocultação do planeta Saturno. Quem ler poderá entender os detalhes trazidos pelo profissional. 

A revista também traz uma reportagem com quatro dos maiores especialistas da atualidade na obra de Pessoa: o português Arnaldo Saraiva, o estadunidense Richard Zenith, o espanhol Antonio Sãez Delgado e o colombiano Jerónimo Pizarro. Ambos falam sobre a contribuição que estão dando à obra do poeta  na atualidade. 

Outras matérias abordam questões divertidas: as frases atribuídas a Pessoa que nunca foram escritas por ele, comuns na internet; e a postura de estudiosos e especialistas em literatura que, definitivamente, são uma exceção, pois não gostam dos escritos do lisboeta.

O tradutor Ioram Melcer também conta a “viagem” que foi traduzir o "Livro do Desassossego" para o hebraico. E Mário Hélio traz uma história curiosa: a admiração de Plínio Salgado, um dos líderes do movimento integralista, pela obra do poeta.