O advogado e escritor pernambucano Marcos Vinicios Vilaça morreu neste sábado (29), aos 85 anos, no Recife. A informação foi confirmada pela Academia Brasileira de Letras, na qual ocupava a cadeira de nº 26, há 40 anos, sucedendo ao poeta, também pernambucano, Mauro Mota.
O escritor faleceu devido à falência múltipla de órgãos, e estava internado na Clínica Florença, nas Graças, zona norte do Recife. Viúvo de Maria do Carmo Vilaça, o casal teve três filhos: Marcantonio Vilaça (já falecido), Rodrigo Otaviano e Taciana, esposa do deputado federal Mendonça Filho.
O velório está marcado para às 16h deste sábado no Memorial Guararapes, em Jaboatão. Vilaça será cremado e suas cinzas serão deixadas no mesmo local que foram as de sua mulher: elas serão espalhadas na Praia da Boa Viagem, seguindo desejo seu e de sua esposa.
A morte de Vilaça acontece no dia em que será velada na ABL, no Rio de Janeiro, a escritora Heloisa Teixeira, acadêmica que morreu nesta sexta, 28, também aos 85 anos.
Ex-ministro do Tribunal de Contas da União e ex-professor de direito internacional, Marcos Vilaça presidiu por duas vezes a Academia Brasileira de Letras, nos biênios 2006-2007 e 2010-2011. O escritor era o membro mais antigo da Academia Pernambucana de Letras, para a qual foi eleito em 1965 e da qual foi presidente de 1970 a 1972, ocupando a cadeira 35.
Filho único de Antônio de Souza Vilaça e Evalda Rodrigues Vilaça, Marcos Vilaça nasceu em Nazaré da Mata, Zona da Mata Norte, em 30 de junho de 1939. Formou-se em ciências jurídicas e sociais pela Faculdade de Direito do Recife.
Vencedor do Prêmio Joaquim Nabuco da Academia Pernambucana de Letras, o seu Em torno da Sociologia do Caminhão, trouxe uma dimensão sociológica para o caminhão. O autor percebeu que o veículo havia se tornado fundamental para o desenvolvimento das cidades brasileiras, a ponto delas nascerem em torno dele, e não mais em torno dos litorais.
Outro livro importante, Coronel, coronéis: Apogeu e declínio do coronelismo no Nordeste (co-escrito com Roberto Cavalcanti em 1965) é considerado um clássico sobre as estruturas de poder no Nordeste do século passado, dominado por coronéis. Vilaça publicou ainda obras como Nordeste: Secos & Molhados (1972), Recife Azul, líquido do céu (1972), O tempo e o sonho (1984) e Por uma Política Nacional de Cultura – Ministério da Educação e Cultura (1984).
Conhecido por sua elegância, Vilaça gostava de usar ternos listrados, chapéus panamás e gravatas estampadas lhe renderam comparações com escritores e ícones fashion americanos, como Truman Capote e Gay Talese. Sua cadeira na ABL pertenceu a outra elegante figura da cultura carioca, o cronista e escritor Paulo Barreto, vulgo João do Rio.
Marcos Vilaça também era conhecido por suas superstições: carro verde (não dá sorte), cocar de índio (político que usa, e não é índio, não vence eleição), carranca (no barco afasta o mau espírito fora do barco atrai coisas ruins), aquários em casa, entre outras - mas que revela ter deixado para trás após a morte do filho Marcoantonio.
No discurso que fez para recebê-lo na ABL, o escritor e ex-presidente da República José Sarney saudou Vilaça como “um político e um homem de letras”. “É seu o gosto da renovação, por inquietação criadora, e o gosto da tradição, pelo cuidado em estabelecer a ligação natural entre o passado e o futuro, de modo que não haja solução de continuidade na teoria de valores do patrimônio nacional”, discursou Sarney..
“O gosto da renovação o impele à política, como processo contínuo dos novos tempos à melhoria das condições sociais e individuais no mundo em transformação – enquanto o gosto da tradição o leva a buscar nas obras representativas de nossa Cultura a própria essência da nacionalidade.
Todo homem, por força de sua condição social, é, necessariamente, um político, tanto por querer influir na comunidade a que pertence quanto por defender essa comunidade. Ninguém se dissocia desse modo de ser, tão antigo quanto o próprio homem. É consubstancial à natureza humana”, disse Sarney, que divulgou nota neste sábado lamentando a morte do amigo.
“Perco um dos meus maiores amigos de estreita amizade que muito me enriqueceu a convivência”, disse o ex-presidente.
Marcos Vínicius gostava de brincar sobre a participação na ABL, afirmando que seus membros tinham direito a dois discursos durante sua passagem pela Casa: a que faziam no ingresso e ao que não tinham acesso, nas homenagens póstumas.
Ele, entretanto, era um defensor ferrenho da instituição, destacando sempre sua importância para a cultura nacional. “O meu fascínio por tudo aquilo que aprendo e apreendo no território acadêmico ensina que a Cultura é mesmo a capacidade de o homem viver flexionado sobre si mesmo. E felizmente somos fiéis no cuidado com a língua portuguesa nos parâmetros entendidos por Miguel Torga: ‘O importante não é a língua em que se escreve. É a língua em que se vive’.”, afirmou Vilaça ao discursar ao deixar a presidência da ABL.
“Marcos Vilaça foi, sobretudo, um intelectual público.”, disse Merval Pereira, presidente da ABL. “ E daqueles que não viam separação entre o erudito e o popular, ao contrário. Fez questão de levar para a Academia Brasileira de Letras, que presidiu por duas vezes, a cultura popular. O que marcava sua atuação intelectual, alem do humor sarcástico, era a criatividade.”
Em nota, o Ministério da Cultura também lamentou a morte do acadêmico. "Com sua forte contribuição política e social, é uma importante referência brasileira, cujo legado será lembrado e continuado por todos aqueles que conviveram e aprenderam com seus feitos", informou a nota.