Edgard Telles Ribeiro toma posse na ABL

O diplomata e escritor Edgard Telles Ribeiro tomou posse na Academia Brasileira de Letras na cadeira 27, sucedendo o poeta e filósofo Antonio Cicero, morto em outubro passado. A cerimônia foi realizada no Petit Trianon, na sexta-feira (4/4) no Rio de Janeiro e foi marcada pela emoção, ao recordar as perdas recentes dos imortais Heloísa Teixeira e Marcos Vilaça, ocorrida na semana anterior.

Foi uma posse bastante prestigiada, que lotou o salão nobre da ABL. Entre os acadêmicos presentes, João Almino, que mora no Paraná e estava no Rio para lançar a nova edição de As cinco estações do amor. Outro imortal com agenda cheia, Gilberto Gil foi cumprimentar o seu companheiro de ministério na época em que o cantor foi Ministro da Cultura. Ailton Krenak se deslocou do interior de Minas Gerais para o Rio.

Ritual

Os acadêmicos Gilberto Gil, Godofredo Oliveira Neto e Antonio Torres introduziram o novo imortal, que vestia um fardão assinado pela estilista Julia Parker, a primeira vez em 35 anos — e apenas a segunda nos 127 anos de ABL — que uma mulher assina o figurino oficial. A outra foi Edite Minervina, em 1990, para a posse de Ariano Suassuna. O discurso de recepção do novo acadêmico foi feito por Ruy Castro. Arnaldo Niskier entregou a espada, representando o decano José Sarney, ausente. O colar foi entregue pelo acadêmico Antonio Carlos Secchin, e o diploma por Ana Maria Machado.

Ao iniciar o seu discurso, Telles Ribeiro destacou o espírito da ABL e dos acadêmicos, definido por ele como um “grupo que nunca cessa de se renovar e, em anos recentes, de se diversificar, em busca de novos caminhos, novos desafios e, quem sabe, novas aventuras”. O desafio ou incertezas apontado pelo novo acadêmico é viria do campo da Inteligência, “seja ela Artificial ou não, e nos ameaçam no que temos de mais precioso –– nossa individualidade”.  Ele alertou ainda para os “efeitos adversos à preservação de certos valores e, em particular, à proteção da diversidade cultural dos povos”.

O novo acadêmico fez um paralelo entre a ABL, para a qual estava entrando, e sua atividade profissional como diplomata do Itamaraty, onde se dedicou 48 anos da vida profissional “trabalhando sempre que possível na área cultural do Ministério [das Relações Exteriores], a qual acabaria chefiando entre 2002 e 2005”. Lembrou ainda do pai diplomata, Milton Telles Ribeiro, e dos colegas de Itamaraty Antonio Houaiss e João Cabral de Mello Neto, que o jovem Edgard conheceu de perto.

Graças à amizade do pai, Edgard Telles Ribeiro conheceu a escritora Clarice Lispector, casada com o também diplomata Maury Gurgel Valente, que servia também em Berna naquele pós-guerra, entre 1947 e 1950.

Um dos antecessores na cadeira 27 foi o professor e crítico Eduardo Portella, com quem Telles Ribeiro trabalhou na elaboração da chamada Convenção da Diversidade Cultural da Unesco.

Como de praxe, o novo ocupante da cadeira 27 comentou sobre seus antecessores – os pernambucanos Joaquim Nabuco, primeiro ocupante, e Dantas Barreto; bem como o gaúcho Gregório da Fonseca, os fluminense Levi Carneiro, Octavio de Faria e Antonio Cicero e o baiano Eduardo Portella.

De Nabuco, Telles Ribeiro destacou que: “o abolicionismo não representava apenas uma causa, mas um sentimento visceral que se confundiu com a missão primeira de sua vida, aquela que possuía sólidas raízes na infância e se manifestaria de forma incisiva na maturidade — influenciando todas as demais vidas que esse grande homem também viveu”. Ele citou um trecho de Nabuco que ele considera profético, pois, nas palavras do novo imortal, previa “que a dívida social contraída pela nação escravocrata dificilmente seria paga pelas gerações seguintes, dado que a abolição, decretada por um ato de governo, não encontraria a contrapartida em uma abolição profunda e necessária, a da cultura escravocrata que, por gerações a fio, predominaria no país”.

Sobre o seu antecessor, Antonio Cicero, o novo acadêmico reconhece que teve poucos encontros, chegou a ir até o apartamento do poeta e filósofo para deixar-lhe livros durante sua campanha à ABL, mas as frases que trocavam eram poucas, “sempre ricas em pausas solenes”, a mesma que encontra em seus poemas.  Desses encontros, sublinhou, “ficou a certeza de seu espírito nobre e de sua extrema delicadeza no trato”.

Mais adiante, em seu discurso, Telles Ribeiro constata sobre a obra de Cicero: “não fosse a sólida formação filosófica, sua poesia possivelmente não tivesse alcançado o grau de rigor, profundidade e erudição que a caracteriza, abrindo espaço, em contraste, para a ocasional leveza das imagens, com cortes inventivos de uma luminosidade cinematográfica, ou rimas que por vezes evocam a harmonia de melodias”. O discurso de posse é concluído com homenagens ao já falecido acadêmico Ivan Junqueira, pelo “apoio que me deu como escritor e não poucas lições de vida, pelas lutas que enfrentou”, e a Antonio Carlos Cecchin, pelo “estímulo de que necessitava para me lançar candidato, mas também a orientação na busca desse objetivo”.

Edgard Telles Ribeiro tem 15 livros publicados. Sua principal obra é O punho e a renda, ambientado na ditadura militar de 1964. Com seu mais recente livro, Jogos de armar (2023), foi finalista da categoria Romance Literário do Prêmio Jabuti. Em 2006, ganhou o Prêmio ABL de ficção, com Olho de rei.

Como diplomata serviu nos Estados Unidos, Equador, Guatemala, Nova Zelândia, Malásia e Tailândia, sendo embaixador nos últimos três.

Nascido em Valparaíso, no Chile, onde seu pai servia como embaixador, Edgard Telles Ribeiro deu foi crítico de cinema no Rio de Janeiro, onde escreveu para os jornais O Correio da Manhã e O Jornal. Estudou cinema na Universidade da California (UCLA). Em 1970, o seu filme “Vietnam, viagem no tempo” foi exibido na Quinzena de Realizadores do Festival de Cannes. De 1978 a 1972, foi professor de cinema da Universidade de Brasília (UNB).