A crítica cultural e o feminismo perderam, na manhã desta sexta (28), um nome crucial: morreu aos 85 anos, Heloísa Teixeira, também conhecida como Heloísa Buarque de Hollanda. Ela estava internada na Casa de Saúde São Vicente, no Rio de Janeiro, onde morava,devido a complicações de uma pneumonia dupla
No ano passado, em março, Heloísa havia publicado seu último grande trabalho: no ano que marcou as seis décadas do golpe militar, a autora lançou o livro Rebeldes e Marginais: Cultura nos Anos de Chumbo (1960-1970), celebrado pela crítica.
A “obra viva”, como foi apresentado o livro na ocasião do lançamento , conta com ensaios, fotografias e QR codes para interação com os leitores, que levam a vídeos, entrevistas e imagens do acervo da autora sobre o período. Foi a primeira vez que a escritora e professora, assinou um trabalho com o outro sobrenome, já que antes usava Buarque de Hollanda, de seu primeiro marido, de quem se separara desde o final da década de 1960. O uso do Ribeiro, segundo Heloísa. Com isso, fez uma homenagem à mãe, figura pouco lembrada nas narrativas que refazem o percurso intelectual e profissional da filha.
Na ocasião do lançamento do livro ela comentou: “Não me considero nem rebelde, nem marginal, agora me considero uma avó muito feliz. Então nenhum nem outro mais, mas continuo querendo mudar o mundo”, disse na ocasião do lançamento, que aconteceu.
Trajetória
Nascida em Ribeirão Preto (SP), teve trajetória de grande influência masculina —como do pai, professor de medicina, de Afrânio Coutinho professor do curso de letras de quem foi assistente no início da carreira, e do sociólogo Darcy Ribeiro vice-governador do Rio de Janeiro que a nomeou diretora do Museu da Imagem e do Som na década de 1980.
As mulheres, porém, motivaram suas mais decisivas escolhas intelectuais, a ponto de a professora de literatura brasileira, formada em letras clássicas pela PUC do Rio de Janeiro em 1961, ter se tornado expoente feminista da crítica cultural no país —e, mais recentemente, principal interlocutora universitária de artistas e escritoras provenientes da periferia.
Em seus dois trabalhos autobiográficos —o volume intitulado Escolhas, de 2009, e a coletânea Onde É que Eu Estou?, de 2019 —, Heloisa relatou a definição progressiva de seu campo de atuação como pesquisadora.
Descobriu o próprio país durante uma temporada nos Estados Unidos, quando, acompanhando o primeiro marido Luis Buarque de Hollanda, atuou como assistente de pesquisa no Instituto de Estudos da América Latina na Universidade Harvard.
Na volta, em 1964, após aproximar-se de Coutinho, ingressou como docente na UFRJ, ministrando cursos principalmente sobre José de Alencar, Lima Barreto e Mário de Andrade, este último, tema de sua pesquisa de mestrado, que resultou na publicação de Macunaíma: Da Literatura ao Cinema alguns anos depois, em 1978.
Até a promulgação do AI-5 em dezembro de 1968, viveu a efervescência no ambiente urbano e universitário do Rio de Janeiro, o que permitiu a construção de sua identidade profissional e de gênero como uma "experiência feminina fundamentalmente coletiva".
No contexto das mudanças comportamentais e políticas de sua geração, em oposição ao regime militar, as mulheres encontravam, sob estímulo do feminismo, um ambiente favorável à entrada na vida pública.
Autora de livros como Cultura e Participação nos anos 60, Pós-Modernismo e Política e O Feminismo como Crítica da Cultura, Heloísa coordenava um programa de cultura contemporânea e o laboratório de Tecnologias Sociais da Universidade das Quebradas na PUC-RJ.