Crimes brutais, assassinatos misteriosos e situações mórbidas têm o poder de fascinar e atrair a atenção dos mortais, como que revelando uma faceta sinistra da humanidade, um lado “noir” latente, mas real, presentes nos mais respeitáveis e pacíficos cidadãos. Prova disso é a audiência angariada por séries televisivas científicas das TVs por assinatura — nas quais crimes hediondos e reais são mostrados — e a popularidade dos romances e filmes ficcionais policiais, que fisgam milhões de fãs e se tornam, quase que invariavelmente, fenômenos editoriais e de bilheteria.
Seria, portanto, óbvio que um livro que se dispõe a analisar crimes, atos obsessivos e personalidades psicopáticas obtivesse atenção total dos aficionados pela área, dos leitores que têm fixação pelo tema e sangue-frio para encarar essas tragédias, com um estranho prazer, apenas no sofá da própria sala. Mas nem sempre essa química funciona. É o caso deO Diabo & Sherlock Holmes — histórias reais de assassinato, loucura e obsessão, de David Grann, lançado no Brasil com o selo da Companhia das Letras.
Reunindo casos bizarros e histórias reais de facínoras, o livro é interessante, tem seus méritos — o principal deles deve-se ao fato de se tratar de um esforço de reportagem —, mas deixa algo a desejar. Como se fosse um romance policial que tem um bom enredo, mas que se perde no meio do caminho com uma narrativa lenta e frouxa. Uma história interessante, porém mal conduzida. Ou seja, que não nos estimula a chegar à última página.
A sinopse do livro — uma coletânea que reúne 12 reportagens verídicas — seduz mais que seu conteúdo. Os que folheiam a contracapa, as orelhas e as páginas introdutórias serão fisgados pelas chamadas que relatam casos, realmente, estapafúrdios, como o do assassinato de um grande estudioso de Conan Doyle e de Sherlock Holmes, que é morto de forma semelhante aos personagens dos romances criados pelo escritor britânico. Ou pelas façanhas de um estelionatário que se faz passar por um adolescente, e que consegue incorporar vários personagens. Como se fosse um camaleão, que, aliás, é o título do capítulo. Ou de um bombeiro que foi atingido pela queda das Torres Gêmeas, mas não consegue lembrar de nada.
Enfim, as histórias são boas, teriam tudo pra deixar o leitor do gênero de olhos vidrados. No posfácio descobrimos, inclusive, que nove dos 12 registros foram publicados no New Yorker, que costuma primar pela qualidade textual do que é editado. É o caso, portanto, de acreditarmos que a tradução talvez não tenha conseguido conduzir as narrativas da forma adequada. Ou então, de questionarmos se Davin Grann, ao contrário da brasileira Ilana Casoy — especialista e autora de títulos de sucesso sobre serial killersnacionais e internacionais que hipnotizam o leitor — tentou romancear fatos reais, como se fossem histórias contadas por Hitchcook ou Patricia Highsmith, mas sem ter talento para tornar o grotesco em algo fascinante. Para nos fazer transcender a barreira entre a normalidade e a loucura desvairada. Enfim, para deixar o leitor se remoendo de curiosidade para desvendar o final.