A disputa entre palestinos e israelenses ocupa o noticiário há muitas décadas. Cotidianamente, somos bombardeados por informações que repetem, sempre, os mesmos fatos: massacres de civis, atentados terroristas e violações aos direitos humanos na Cisjordânia, na Faixa de Gaza e em Israel. Uma matança interminável, impiedosa, que se acirrou no Pós-Guerra, mas que se arrasta desde o final do século 19 – quando os judeus começaram a migrar para a região.
O jornalista-quadrinista norte-americano Joe Sacco já havia mostrado o inferno vivenciado por cidadãos árabes e judeus na premiada HQ-reportagem Palestina: uma nação ocupada, publicada em 1995, e que lhe rendeu o American Book Award em 1996, o primeiro concedido a uma narrativa jornalística em formato de quadrinhos. Em Notas sobre Gaza, recém-lançado no Brasil, ele repete a fórmula, em todos os detalhes. Apresenta uma bem construída reportagem, nos melhores moldes do new journalism, mas também mostra que é um quadrinista habilidoso, utilizando com sensibilidade os recursos gráficos dos retroquadros – termo cunhado por Will Eisner para designar o espaço dedicado à diagramação e distribuição das cenas e falas nas páginas. Em vários momentos, alterna flash-backs e ações em tempo real, sobrepõe diálogos, contrapõe narrativas, lançando mão apenas dos recursos de balões e quadros. Sacco, de certa forma, também inova no argumento. Na verdade, resgata dois episódios esquecidos da história palestina, sobre os quais os registros, tanto oficiais quanto extraoficiais, são obscuros e não necessariamente confiáveis. Investigou o massacre de civis nas vilas de Khan-Younis e Rafah, que ocorreram no ano de 1956, no fim da Guerra de Suez, época em que Israel criou uma aliança secreta com a França e a Inglaterra, contra egipcios e palestinos.
Para tanto, passou um período na região – por volta de 2003 – convivendo com os sobreviventes, seus parentes e ouvindo relatos que indicam terem sido, os dois episódios, massacres bárbaros e covardes contra civis inocentes. Os relatos dão conta que, a pretexto de encontrar guerrilheiros (à época ainda não existiam os terroristas), os soldados israelenses massacraram quase toda a população masculina entre 15 e 60 anos residente nas duas cidades. Episódio, que segundo Sacco, foi fundamental para que o ódio contra os judeus fosse “semeado” no coração dos palestinos”.
Com mais de 400 páginas, a graphic novel é esclarecedora e reforça o que já sabemos: a matança de milhares de civis continuará, caso o resto do mundo faça de conta que não tem nada a ver com isso. No prefácio à primeira edição, na qual faz uma atualização dos fatos pós-2003, o próprio Sacco admite não ver alternativas imediatas para uma saída pacífica. Muito pelo contrário. Ele afirma que longe de se vislumbrar uma solução,o conflito só faz acirrar mais ódio nos dois lados.
Quadrinhos
Notas sobre Gaza
Autor: Joe Sacco
Editora: Quadrinhos na Cia.
Preço: R$ 55
Páginas: 432