Socióloga publica estudo que analisa os sonhos de quem só quer uma casinha no campo

A frase de uma recifense que tem casa em Gravatá, colhida pela socióloga Ana Lúcia Hazim Alencar, diz tudo: “Quando eu volto de lá, retorno com algum sonho, querendo realizar alguma coisa”.
No livro Estilo de vida e sociabilidade – relações entre espaço, percepções e práticas de lazer na sociedade contemporânea, Ana Lúcia aponta as motivações das famílias de classe média que mantêm uma segunda residência em Gravatá, cidade que se tornou um dos mais concorridos polos de lazer interiorano de Pernambuco. A pesquisadora se baseia nas ideias do sociólogo francês Pierre Bordieu, que escreveu sobre os julgamentos estéticos como distinção de classe, para exemplificar o que levaria as pessoas a exercerem o que ela chama de “estilo Gravatá”, o que “exige capital econômico e social específicos, assim como um gosto particular e delimitado socialmente”.
Hazin apresenta uma série de depoimentos que reafirmam a casa de campo como a possibilidade de retorno à natureza sem abdicar dos confortos da cidade grande: Gravatá, a 85 km do Recife, seria um dos principais símbolos de um ruralismo idealizado, que ressalta características que se vinculam, principalmente, à memória de um passado vivido em casas com quintais, onde convivia a família ampliada e animais domésticos, e o contato com os vizinhos era frequente.
A casa na região serrana é vista como forma de oferecer mais qualidade de vida aos filhos. O fator sociabilidade é o mais apontado na pesquisa. Ninguém admite que a casa de campo é também um símbolo de status, que reafirma as diferenças sociais. “Ter somente a certeza dos amigos do peito e nada mais”, como diz a canção de Zé Rodrix e Tavito, é a motivação das famílias de classe média que realizam o sonho de comprar uma casa em Gravatá.
Apesar de apontarem a necessidade de estreitar os vínculos familiares, conviver com a natureza e se relacionar com os vizinhos com informalidade e confiança, na prática, muitas famílias reproduzem, aponta o estudo, na segunda residência o estilo urbano a que estão acostumados, principalmente quando confinadas em condomínios.
É comum  que o lazer se dê em espaços privados, geralmente na base do churrasco, bebida e, não raro, som alto. Ao mesmo tempo, a vida moderna dificulta abrir mão das facilidades tecnológicas, utilizando-se os meios de comunicação a que se está acostumado. A defesa de um estilo de vida natural se resume à decoração com móveis rústicos, ao uso de roupas mais despojadas - que nem sempre dispensam grife - e a quebra da rotina. A convivência com os elementos rurais reside na mera contemplação. Como toda boa utopia, a Gravatá dos recifenses está longe de ser real.