Yeats 1 Vitor Fugita nov.22

 

William Butler Yeats (1865-1939), escritor, dramaturgo e místico irlandês, é reconhecido como um dos grandes poetas do século XX. Vencedor do Prêmio Nobel de Literatura em 1923, teve vida e carreira longevas. Em sua extensa obra se destacam coleções como Uma visão (1925) e livros como A torre (1928) e A escada em caracol e outros poemas (1933). Mantive as regularidades métricas e os esquemas rímicos dos originais, sempre que possível. Os poemas foram extraídos de Collected poems (Selo Macmillan Collector’s Library, 2016).

 

AO ME PEDIREM UM POEMA SOBRE A GUERRA
Acho melhor, em tempos como esses,
Calar, poeta: falta-lhe a virtude
De corrigir um líder de governo.
Já se mete demais nos interesses
Da moça na ociosa juventude
Ou de um velho numa noite de inverno.[nota1]

 

AEDH DESEJA OS TECIDOS DO CÉU
Se eu possuísse o céu e seus tecidos
Bordados de ouro e prateada luz,
O azul e o fosco e os escuros tecidos
Da noite e da luz e da meia-luz,
Deitaria os tecidos sob seus pés:
Mas, sendo pobre, só tenho meus sonhos;
Deitei os meus sonhos sob seus pés;
Pise leve, pois você pisa em meus sonhos.[nota2]

 

UM MANTO
Da minha canção fiz um manto
Bordado com primazia
Com antigas mitologias
Do calcanhar à garganta;
Mas imbecis o tomaram,
Exibiram sua beleza,
Como se o tivessem tecido.
Deixe, canção, que eles nos
Roubem: não há maior proeza
Do que andarmos nus.[nota3]

 

QUANDO ESTIVERES VELHA
Quando estiveres velha, grisalha e exausta,
Cochilando junto ao fogo, pegue este livro,
E leia devagar, sonhe com o brilho vivo
Que teus olhos tinham outrora, sombras vastas.

Quantos amaram teus momentos radiantes
E tua beleza, com paixão falsa ou genuína,
Mas só um amou tua alma peregrina,
Amou as mágoas de tua face cambiante.

E junto à lareira, curvada entre centelhas,
Murmure, triste, como o Amor fugiu ao léu,
E galgou montanhas acima, rumo ao céu,
E escondeu sua face na multidão de estrelas.

 

CANÇÃO DE BEBER
Por nossa boca entra o vinho
E pelos olhos o amor:
Isso aprendemos sozinhos,
Velhice ao fim do esplendor.
Ergo esta taça um pouquinho
E olho pra ti, que calor.

 

AS QUATRO IDADES DO HOMEM
Combateu o corpo, seu desafeto.
O corpo venceu; caminha ereto.

Depois lutou com o coração;
Paz e inocência logo se vão.

Então lutou com a mente;
Largou seu coração insolente.

Agora é com Deus a desavença.
Dá meia-noite: que Deus vença.

 

MORTE
Nem pavor nem fé assistem
Um animal moribundo;
Aguarda seu fim um homem
Temendo e esperando tudo;
Morreu mais de uma vez,
Muitas reergueu-se, redivivo.
Um grande homem em sua altivez,
Confrontando assassinos,
Desdenha, sem alvoroço,
Da respiração e seu corte;
Conhece a morte até o osso —
O homem criou a morte.

 

 

NOTAS

[nota 1] Poema escrito em 6 de fevereiro de 1915. Os escritores Henry James e Edith Wharton haviam pedido a Yeats um poema sobre a Primeira Guerra Mundial, que integraria uma publicação que visava levantar fundos para refugiados belgas. Ironicamente, Yeats respondeu com um poema aparentemente apolítico, que se recusa falar sobre a guerra.

[nota 2] Aedh (cujo nome significa “fogo”) é o deus do submundo na mitologia irlandesa.

[nota 3] Um manto, assim como Quando estiveres velha, foi inspirado por Maud Gonne (1866-1953), atriz e feminista irlandesa, grande paixão do poeta.

 

 

Yeats 2 Vitor Fugita nov.22