Curitiba, 13 de abril de 2012.
Meu nome é Caetano Waldrigues Galindo. Eu traduzi o Ulysses, de James Joyce.
Muito prazer.
A tradução do meu Ulysses acabou em 2004. Dia 16 de junho, no ano em que se completavam os 100 anos do dia em que se passa a história do romance. Ponto final. Sim. Fim. De dois anos de trabalho diário.
E vai para a proverbial “gaveta”.
Em 2008 eu comecei a fazer traduções para a Companhia das Letras, e entrei em contato com o editor André Conti, que é um grande fã de Joyce. A partir daí começou um processo bem lento de negociações,insinuações e tentativas, que culminou com a decisão de esperar o ano mágico de 2012, com a liberação dos direitos autorais sobre a obra de Joyce, e publicar o tal do Ulysses. Agora nosso.
A espera, além de tudo, geraria a possibilidade de uma revisão final e total do texto, que tinha nesses anos sofrido somente alterações pontuais, conforme pedidos de quem ia fazer uma leitura, uma encenação, e queria usar um trecho ou outro.
Nesse meio tempo veio a notícia da parceria Penguin-Companhia das Letras. O Ulysses coube muito bem no projeto e, com ele, vieram o melhor texto (há mais de uma versão do Ulysses) e o aparato crítico de primeiro mundo da Penguin. Ponto para nós.
E que comecem os trabalhos de revisão.
Em 2010 eu tive a chance de ir a Zurique visitar a Fundação James Joyce, dirigida pelo grande Fritz Senn, e conversar com os joyceanos da Universidade de Viena, onde dei uma palestra sobre a tradução. Na volta, como um pós-doutorado (falei que o Ulysses originalmente era parte do meu doutorado?), passei um tempo no Rio de Janeiro discutindo questões gerais da tradução de Joyce com Paulo Henriques Britto, simplesmente o melhor tradutor do Brasil.
E foi aí que as coisas começaram a ficar intensas.Quer ver?
Se entre 2004 e 2006 o livro passou por apenas uma releitura inteira; se entre 2007 e 2009 ele ficou quietinho, estável e marinandinho, em 2010 ele começou a virar do avesso. Entre a versão 2004 e a publicada houve quase 57 mil alterações, tudo no sentido de esticar os limites do português literário brasileiro pra fazer ele comportar o ludismo e os mecanismos de Joyce. E foi mais ou menos assim. Segundo semestre de 2010. Comecei a reler (cotejando de novo com o original, num processo de quase retradução às vezes) o texto todo, episódio a episódio. Terminada essa leitura, com o texto já bem diferente, eu passava os documentos para o grande Britto, a essa altura já oficializado pela editora como Coordenador Editorial do projeto. Ele lia cada um, fazia dezenas, às vezes centenas de comentários a cada um deles e me devolvia.
(Eu, a essa altura, claro, estava já adiantado na revisão do episódio seguinte.)
Aí para tudo. Relê o episódio anterior com as sugestões do Britto. Recusa algumas (a pessoa tem direto de ser idiossincrática, né? Ainda mais num livro desses), aceita imensas, deixa uns 10 por cento em suspenso. Esses 10 por cento, de todos os episódios, foram depois discutidos pessoalmente, no Rio, ou via Skype, para a gente poder chegar a uma versão “final” de cada episódio.
A tradução do Ulysses foi acabando aos poucos, já em 2010.
Só que quando tudo isso acabou eu meio que achei que precisava fazer uma releitura geral do livro. O Ulysses é o livro mais amarradinho do mundo. Cada alteração que você faz acarreta, com frequência, a necessidade de catar aquela palavra, ideia, no livro todo, para uniformizar. E eu queria não perder essa visão de todo.
Primeiro semestre de 2011. Relendo o livro todo de novo, agora com mínimas consultas ao original, e refazendo e refechando e rechecando todas essas intercorrespondências.
A tradução do Ulysses, de fato, acabou na metade de 2011.
O texto foi para a mão do André. Pronto. Finalizado.
Mas não, né?
Porque aí o André leu tudo, formatou tudo pelo padrão da editora, tomou várias decisões mais gerais e fez, claro, os seus comentários também. E toca reler tudo e decidir o que alterar ou não. Mas aí fechou. Fechamos.
A tradução do Ulysses acabou no comecinho de 2012.
E o livro foi para revisão. E voltou, ora, com milhares de comentários. Os revisores (Huendel e Joana, foram verdadeiros santos). Devolvi as provas para a editora com pouco menos de 200 alterações.